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Atos 21:17-26
Atos 21:17-26

Atos 21.17-26: Chegada de Paulo a Jerusalém 

 

Os demais capítulos de Atos descrevem os "grilhões e provações" que Paulo teve de enfrentar. O fato de tão grande parte do livro ser dedicada às aflições paulinas pode dever-se ao desejo de Lucas de simular a narrativa da paixão de Cristo nos evangelhos, em que os eventos de uns poucos dias são narrados em tão grande extensão, que isto até parece desproporcional em relação ao todo (veja a disc. sobre 19:21-41). Toda­via, devemos lembrar-nos de que o próprio Lucas deveria estar envolvido nesses acontecimentos, de maneira que esses lhe pareceram imensos, havendo grande riqueza de experiências de primeira mão para narrar.

21:17 / Lucas não nos informa se o grupo chegou a tempo a Jerusalém, para as festas (20:16), mas a viagem tranqüila, em ritmo de passeio, chegou ao fim, e a presença de muitos visitantes na cidade (cp. v. 20), inclusive certo número de judeus da Ásia, nos sugere que o grupo chegou a tempo para o Pentecoste. Ao chegarem, foram recepcionados pelos irmãos — talvez pelos que mais se simpatizavam pelo trabalho desen­volvido por Paulo.

21:18 / No dia seguinte realizou-se uma reunião mais formal com Tiago, que agora era sem dúvida o chefe da igreja em Jerusalém, que ele dirigia com a ajuda dos anciãos (veja as notas sobre 11:30 e 12:17). Paulo havia-se preocupado com a possibilidade de as ofertas das igrejas gentílicas poderem ser rejeitadas (Romanos 15:31; veja a disc. sobre 19:21), mas Tiago e os demais líderes (diferentemente de alguns dentre o povo) aparentemente receberam Paulo muito bem, e podemos presumir que receberam as ofertas com o mesmo espírito com que foram doadas (cp. 24:17). A presença dos outros delegados nesta reunião (Paulo foi conos­co - última indicação da presença de Lucas até 27:1) parece dar apoio a esta idéia.

21:19 / Paulo saudou-os e contou com detalhes... seu ministério

(o grego dá o sentido de alguém que narra cada minúcia) — de fato uma narração muito longa! Mas visto que o leitor já conhece grande parte da história, Lucas dá-se o trabalho de tecer tão somente o fio que a percorre de ponta a ponta, a saber, que o próprio Deus havia feito a obra, e agradara-lhe servir-se de Paulo (cp. 14:27; 15:4; Romanos 15:18s.). Era sumamente importante que Paulo enfatizasse este tema, por haver ainda judeus cristãos que questionavam a legitimidade da missão gentílica.

21:20 / Os líderes prontamente louvaram a Deus ao ouvir o relatório de Paulo. Todavia, salientaram que a presença dele agora na cidade com certeza iria provocar indignação entre milhares de judeus cristãos que permaneceram zelosos da lei (veja a nota sobre 1:13). Quanto à persist­ente aderência de grande número de judeus cristãos à lei, veja as notas introdutórias de 15:1-21. A referência de Tiago a "milhares" de tais judeus crentes tem sido olhada com suspeita por alguns eruditos, visto que a população total de Jerusalém não era grande (veja a nota sobre 4:4). Todavia esse número poderia ter incluído muitos cristãos que visitavam Jerusalém nas festas.

21:21 / O problema era que tais judeus cristãos haviam sido informa­dos de que Paulo pregava contra a lei. Tais informações chegaram a esses homens não mediante mero "ouvir dizer". O verbo implica que eles haviam sido explicitamente instruídos no que concernia às atividades de Paulo, o que significa que isso era obra dos intransigentes "homens da circuncisão" que se concentraram em perseguir o apóstolo e perturbar-lhe o trabalho (veja a disc. sobre 11:2; 15:1-5). É muito provável que eles tenham sido a causa de grande parte dos transtornos de Corinto, visto terem estado na Galácia, e ameaçavam ir a Filipos e a Roma (veja as respectivas cartas de Paulo). Por toda a parte esses homens maltratavam a Paulo, porque lhe compreendiam mal a doutrina. Quanto mais ele anunciava a doutrina da salvação pela graça, mais era acusado falsamente pelos seus inimigos de induzir os judeus da diáspora a se apartarem de Moisés, isto é, a jogar fora toda restrição moral (cp. Romanos 6:1ss.; Gálatas 5:13). Quanto à circuncisão em particular, sem dúvida alguma muitos judeus cristãos foram influenciados por ensinos como o de Romanos 2:25-30 e Gálatas 4:9 e 5:6, e chegaram à conclusão de que já não havia mais razões para judeus e gentios cumprirem esse rito. Daí a acusação contra Paulo que dizia que não deviam circuncidar seus filhos, nem andar segundo os costumes da lei [judaica]. Entretanto, embora Paulo com certeza não advogasse a prática da circuncisão (cp. Gálatas 5:11), não se opunha a que os judeus cristãos a praticassem e, elo que sabemos, nunca instruiu alguém contra sua prática (cp. Roma­nos 2:25; 3:1ss.; 7:12).

21:22 / Sem dúvida, Paulo foi capaz de tranqüilizar os anciãos e Tiago quanto a esta questão. Na verdade, eles efetivamente endossaram a posição paulina ao referir-se às decisões conciliares do cap. 15 (v. 25). Todavia, persistia o problema da imagem pública de Paulo perante os que eram "zelosos da lei".

21:23-24 / Resolveu-se, portanto, que Paulo mostraria seu respeito pela lei ao associar-se publicamente a quatro homens que havia pouco fizeram voto. Paulo deveria purificar-se: santifica-te com eles (v. 24). Parece que tais homens eram membros da igreja e, pela descrição que se segue, teriam feito um voto temporário de nazireu, do mesmo tipo que Paulo fizera tempos atrás (18:18). A duração desses votos era opcional, mas parece que o mínimo era de trinta dias (cp. Josefo, Guerras 2.309-314). Se assim fosse, seria difícil acreditar que Paulo se houvesse comprometido por tão longo tempo. Todavia, no regulamento dos votos de nazireu em Números 6:1-21 há provisão para a quebra acidental do voto (vv. 9-12). Exigia-se um período de purificação de sete dias, no final do qual, isto é, no sétimo dia, o homem rapava a cabeça e, no dia seguinte, oferecia o sacrifício apropriado no templo. Agora ele podia prosseguir em seu voto original até seu cumprimento total (vv. 13-21). A partir das referências aqui feitas à "purificação" (v. 24, 26) e aos "sete dias" (v. 27), parece que se pedia a Paulo que se unisse aos quatro homens nos ritos sobre imundícia acidental (faze por eles os gastos), que pagasse o preço cobrado pelo templo (v. 24; cp. Josefo, Antigüidade 19.292-296). Todavia, entre muitos eruditos surge a questão: será que o Paulo histórico teria concordado com tal proposta? Vimos, contudo, que aparentemente Paulo continuou sendo um judeu praticante (veja a disc. sobre 15:1-21); embora ele houvesse questionado a eficácia desse rito (cp., p.e., 1 Coríntios 1:30), não nos parece que teria sido muito difícil para Paulo ter concordado com a sugestão, segundo sua própria regra de 1 Coríntios 9:20s.

21:25 / Entretanto, ficou bem entendido que o que se pedia que Paulo fizesse nenhuma implicação tinha para os gentios crentes. A decisão do concilio de Jerusalém estava em vigor, e de acordo com esta nenhuma exigência legal se deveria lançar sobre os gentios como requisito para a salvação. Não se lhes exigiria, sendo cristãos, que se prendessem a certos padrões de conduta e dieta alimentar (cp. 15:19-21, 23-29). É estranho que o decreto conciliar seja repetido palavra por palavra, mas talvez Lucas tivesse em mente a presença de crentes que não o tinham ouvido antes; pode ser que Lucas houvesse transcrito para seus leitores (como o faríamos numa nota de rodapé) apenas um resumo breve dos decretos. Por outro lado, Marshall sugere que esta teria sido a primeira menção do decreto na fonte dos textos na primeira pessoa do plural, e que Lucas deixou de mencionar tal fonte à luz da primeira menção (p. 356; cp. v. 10).

21:26 / Por deferência aos líderes da igreja, Paulo concordou com a proposta deles, e pôs-se a providenciar o necessário para cumprir as exigências legais. No dia seguinte tomou os quatro homens e passou com eles pelo rito de purificação. Ao mesmo tempo, fez provisão para o sacrifício, com o qual completaria o rito.

 

Notas Adicionais # 56

21:24-26 / A dificuldade destes versículos reside no fato de serem conden­sados, havendo grandes probabilidades de o próprio Lucas não ter entendido bem o que é que os líderes queriam que Paulo fizesse. Entretanto, o conselho a Paulo: santifica-te com eles, e faze por eles os gastos (v. 24) deve significar muito mais do que simplesmente "pagar as despesas" daqueles homens, como alguns eruditos têm sugerido. Paulo participou de fato de algum tipo de cerimô­nia, e apresentamos na exposição acima o que nos parece a explicação mais satisfatória sobre a natureza da cerimônia.

Faze por eles os gastos: (v. 24): Supõe-se às vezes que Paulo teria pago tais despesas com o dinheiro da coleta. No entanto, há evidências de que, pelo fato de trabalhar a fim de sustentar-se e a outros em suas viagens missionárias, Paulo possuía algum dinheiro, seu mesmo. Ele pôde manter-se durante dois anos na Cesaréia, e durante mais dois anos em Roma, e Félix tinha a esperança de que Paulo lhe oferecesse suborno.

Quanto aos gentios que têm crido, já escrevemos (v. 25): "já lhes demos nossa decisão" — o mesmo tom autoritário de antes (veja a disc. sobre 15:19s.); aqui ela vem no plural.